Um estudo desenvolvido pelo pesquisador do Instituto de Física de São Carlos (IFSC/USP), Dr. Bruno Pereira, tendo em vistas a descontaminação e desinfecção total de produtos alimentares frescos nas linhas de produção – vegetais e similares -, levou ao desenvolvimento de um reator que, através de irradiação UVC, oferece uma alternativa viável sem que sejam utilizados produtos químicos e que, comprovadamente, se mostrou eficaz contra um amplo espectro de microrganismos.
Para entender melhor
A crescente preocupação mundial com o crescimento populacional leva à necessidade urgente para a produção adequada de alimentos e sua distribuição equitativa. Assim, à medida que a população mundial cresce, a demanda por alimentos processados aumenta, pressionando as indústrias a aumentar a produção e, inclusive, a priorizar a segurança dos consumidores, sendo que a contaminação de alimentos ainda é uma ameaça para o setor de manufatura. Ao longo dos anos, especialistas de várias áreas de pesquisa desenvolveram protocolos, documentação e procedimentos para monitorar meticulosamente as contaminações que surjem ao longo do ciclo de produção de vegetais frescos, especialmente na lavagem final desses produtos, tendo especial atenção ao controle microbiológico, pelo que agências reguladoras, como a ANVISA (Brasil) e a FDA (EUA), desempenham um papel crucial na garantia da segurança alimentar.
Um aspecto crítico da segurança alimentar é o controle microbiológico. O protocolo Clean-In-Place (CIP), utilizando agentes sanitizantes, como hipoclorito, ácido peracético e hidróxido de sódio, ajuda a controlar o crescimento microbiano, contudo o uso dessas e de outras soluções químicas como suporte à produção de vegetais frescos levanta preocupações sobre impactos ambientais e potenciais riscos à saúde. Inserido em uma nova abordagem dessas questões, na busca pelo desenvolvimento de novas tecnologias e formulações, este estudo do pesquisador do IFSC/USP visa introduzir, através da aplicação de UVC, uma técnica que pode aprimorar o processo de fabricação, garantindo ao mesmo tempo um controle rigoroso na área da contaminação.
Um estudo iniciado em 2019
Este estudo começou bem no início do doutorado do pesquisador Bruno Pereira – 2019 – com o foco de buscar uma interação entre a engenharia de alimentos e a ótica, tendo surgido, então, a oportunidade do pesquisador realizar uma visita técnica a uma produtora de vegetais congelados, no México, produtos esses destinados à exportação para os Estados Unidos e Europa. “Essa produtora tinha um sério problema, já que utilizavam grandes quantidades de agentes químicos na lavagem dos produtos com a finalidade de diminuir a carga microbiológica, gerando problemas ambientais, o que levou os Estados Unidos e a Europa a bloquearem a importação dos produtos dessa empresa”, explica Bruno Pereira. Foi a partir dessa constatação que o pesquisador do IFSC/USP enxergou a possibilidade de aplicar a radiação UVC para a descontaminação dos produtos. O pesquisador sabia da efetividade do UVC na neutralização microbiológica e a partir daí propôs à citada indústria que introduzisse uma nova metodologia, algo que foi testado posteriormente no IFSC/USP. Nos laboratórios do Instituto, Bruno Pereira realizou experimentos onde foram contaminados produtos vegetais frescos, tendo mostrado nesse estudo que havia, de fato, a possibilidade da aplicação de UVC sem provocar qualquer dano aos vegetais e sem a necessidade de utilizar qualquer produto químico. “Na verdade, conseguimos determinar uma equação física, uma equação que descreve o efeito físico e no qual temos a variável “tempo e radiação” e também a concentração. Então, você tem o tempo, a radiação e a concentração do micro-organismo que entra no produto. Baseado nessa equação, conseguimos determinar o tempo de radiação UVC necessária para decair a concentração de micro-organismo na lavagem final dos produtos, para um nível seguro baseado na legislação de cada país. Conseguimos, também, quantificar e mostrar estatisticamente que há uma diferença significativa, uma diferença estatística. Todo esse processo gerou uma patente no meu doutorado”, sublinha o pesquisar do IFSC/USP.
Atualização da pesquisa
Um novo artigo científico publicado pelo Dr. Bruno Pereira em janeiro deste ano apresenta uma nova equação relacionada com a pesquisa inicial realizada, baseada em mecânica de fluidos, onde se determinou de forma teórica a porcentagem de decréscimo de microrganismos, principalmente da bactéria Escherichia coli, bastante presente nos vegetais frescos. “De fato, no laboratório contaminamos alguns vegetais frescos com a bactéria Escherichia coli, que é uma bactéria gram-negativa muito comum em nossa flora e que provoca contaminações cruzadas imediatamente a partir da manipulação nos campos, gerando, por isso, diversas doenças. Embora soubéssemos que essa bactéria apresenta uma maior resistência à radiação de UVC, o certo é que na simulação que realizamos no laboratório pudemos constatar que essa radiação neutralizou a bactéria, o que que significa dizer que o controle de qualidade do produto e a segurança alimentar ficam asseguradas na parte final de todo o processo”, finaliza o pesquisador, acrescentando que este estudo poderá servir como uma contribuição para a literatura científica e para todos quantos trabalhem na área da descontaminação de vegetais frescos.
Para conferir o artigo científico publicado na revista “MDPI” clique https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S1572100024004988?via%3Dihub