Com Bolsonaro denunciado, apenas FHC escapa entre os ex-presidentes pós-ditadura

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A denúncia contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) por liderar uma tentativa de golpe de Estado após as eleições de 2022 marcou um novo capítulo na história política brasileira. Com essa acusação, formalizada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) no último dia 18 de fevereiro, sete dos oito ex-presidentes do Brasil desde a redemocratização, iniciada após o fim da ditadura militar em 1985, já enfrentaram denúncias na Justiça por suspeitas de crimes diversos.

Bolsonaro foi acusado de encabeçar uma trama golpista que visava mantê-lo no poder e impedir a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), eleito em 2022. A PGR aponta crimes como organização criminosa armada, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado pela violência e grave ameaça, além de deterioração de patrimônio tombado. A denúncia é resultado de investigações sobre os atos que culminaram na invasão das sedes dos Três Poderes em Brasília, em 8 de janeiro de 2023.

Uma lista de ex-presidentes sob escrutínio

Além de Bolsonaro, outros ex-mandatários do período pós-ditadura também enfrentaram acusações formais. José Sarney (MDB), primeiro presidente civil após o regime militar, foi denunciado duas vezes em 2017 no âmbito da Operação Lava Jato por corrupção ativa, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Ambas as denúncias, porém, foram arquivadas ou rejeitadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) devido a prescrição ou falta de prosseguimento.

Fernando Collor (hoje no PRD), que governou entre 1990 e 1992, enfrenta atualmente a situação jurídica mais delicada entre os ex-presidentes. Denunciado pela PGR por corrupção passiva e lavagem de dinheiro em um esquema na BR Distribuidora, ele foi condenado pelo STF em 2023 a oito anos e dez meses de prisão, sendo o primeiro ex-presidente condenado criminalmente desde a redemocratização.

Itamar Franco, que assumiu após o impeachment de Collor e faleceu em 2011, foi alvo de uma denúncia nos anos 2000, quando era governador de Minas Gerais. A PGR o acusou de ofender a honra do então presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), mas o processo foi arquivado por prescrição.

Lula, atual presidente, também tem histórico judicial movimentado. Durante os anos da Lava Jato, foi réu em 11 ações penais, sendo condenado em 2018 por corrupção e lavagem de dinheiro no caso do tríplex do Guarujá. Ele cumpriu 580 dias de prisão, mas as sentenças foram anuladas pelo STF em 2021, permitindo sua volta à cena política.

Dilma Rousseff (PT) e Michel Temer (MDB), que completam a lista dos presidentes pós-ditadura, também enfrentaram investigações e denúncias. Dilma foi citada em delações da Lava Jato, mas nunca chegou a ser formalmente denunciada como ré. Já Temer foi denunciado duas vezes em 2017 por corrupção passiva, organização criminosa e obstrução de Justiça, mas as acusações não avançaram devido à falta de aval da Câmara dos Deputados para o prosseguimento enquanto ele estava no cargo.

Exceção à regra

O único ex-presidente do período pós-ditadura que não foi denunciado é Fernando Henrique Cardoso (PSDB), que governou entre 1995 e 2002. Apesar de ter sido mencionado em investigações, como no caso envolvendo Itamar Franco, ele nunca enfrentou uma acusação formal da PGR.

Contexto histórico e político

A sequência de denúncias contra ex-presidentes reflete um cenário de intensificação do escrutínio judicial sobre a classe política brasileira nas últimas décadas. Especialistas apontam que a Operação Lava Jato e o fortalecimento de instituições como a PGR e o STF contribuíram para esse fenômeno, expondo esquemas de corrupção e tentativas de subversão da ordem democrática.

No caso de Bolsonaro, a denúncia ganhou contornos inéditos por ser a primeira vez que um ex-presidente é acusado de tentar atacar diretamente o Estado Democrático de Direito. A PGR sustenta que ele liderou uma organização criminosa com forte influência militar, que planejou desde a desestabilização do sistema eleitoral até atos violentos contra as instituições. A análise da denúncia agora cabe ao STF, que decidirá se Bolsonaro e os outros 33 denunciados no caso se tornarão réus.

Enquanto o processo segue, o Brasil acompanha mais um capítulo de sua história política marcado por tensões entre democracia e acusações de crimes graves envolvendo seus ex-líderes. Dos oito presidentes que passaram pelo Palácio do Planalto desde o fim da ditadura, apenas um permanece fora do radar judicial, evidenciando os desafios de consolidação institucional no país.